À trois

Luis Sergio Ferreira

Chega um momento que não dá mais pra conviver com a dúvida. Ou você acaba com ela ou ela acaba com você. Liguei para o serviço e inventei uma desculpa pra dizer que não iria trabalhar. No mais, fiz meu ritual diário como se tudo estivesse na maior normalidade. No lugar do notebook, coloquei na maleta meu velho 38. Despedi-me dela e entrei no carro. Dirigi somente até pouco após a esquina. Estacionei o carro e fiquei observando. Não levou nem quinze minutos para o outro chegar e entrar na minha casa. Era o dia de acertar as contas com aquela safada. Retirei a arma da maleta, coloquei-a na cintura, abri a porta do carro e fui em direção à casa. Nem precisei usar as chaves, pois os cretinos sequer lembraram de trancar a porta. Cheguei à sala e lá estavam os dois abraçados. Inicialmente, fizeram olhares de surpresa que, rapidamente, mudaram quando me viram puxar a arma que estava na cintura. O covarde nem falou nada, apenas correu e fugiu pela porta dos fundos. Ela veio e se ajoelhou aos meus pés, segurando em minhas calças e dizendo para eu me acalmar, pois não era nada do que eu estava imaginando. Ao olhar para seus olhos, lembro os ares de ironia que pareciam existir já há algum tempo nos rostos dos colegas de serviço e dos vizinhos, denunciando o que somente eu não sabia. Fiquei privado de quase todos os sentidos e não consegui ouvir uma palavra sequer do que ela tentava me dizer. Levantei a cabeça e observei que todas as janelas estavam abertas, mas ninguém havia para testemunhar aquela humilhação. Baixei a cabeça e olhei-a novamente nos olhos com minha face então tomada pela raiva. Seu rosto se encheu de medo e ela se calou. Apontei o revólver e mandei logo dois tiros. Imediatamente seu corpo se estendeu no chão e eu saí porta afora correndo rumo ao meu carro. Entrei nele e comecei a dirigir em alta velocidade. Tudo foi muito rápido, mas fiz o que era necessário. A história havia acabado. Atravessei o cruzamento sem perceber que o sinal estava fechado pra mim. Ouviu-se, então, o grito dos pneus antes que a camioneta me acertasse em cheio na porta do motorista. E foi isso o que aconteceu. Primeiro foi o dela e agora era o meu: FIM.

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Era o entardecer de um sábado qualquer e tudo parece ter começado, ao menos pra mim, naquela sala de cinema. Em quase duas horas de sessão, não pude deixar de perceber o comportamento alegre e, ao mesmo tempo, desconfiado daquele casal de namorados. Tinha ares de amor proibido. O filme acabou e eles foram os primeiros a levantar e a sair da sala. Pareciam estar apressados. Coincidentemente, na saída do shopping, começamos a caminhar na mesma direção. Eles iam a cerca de trinta ou quarenta metros na minha frente, mas foi distância suficiente para eu poder ver tudo o que aconteceu. De repente, alguém surgiu de dentro da parada do ônibus e apontou uma arma para o casal. Inicialmente, pensei que fosse um assaltante, mas logo percebi que ela parecia conhecê-lo. Não avancei nem mais um metro. Fiquei apenas observando tudo atrás de uma árvore. De onde estava, pude ver quando o “namorado” fugiu sem receber a menor atenção do individuo armado, que apenas acompanhou-o com a cabeça, mantendo a arma mirada para a moça. Ela gritava, gesticulava e parecia tentar se explicar para ele que, de outro lado, permanecia calado. Com um giro de pescoço, ele deu uma última observada ao seu redor, procurando ver se alguém estava a testemunhar aquela situação. Novamente, ele volta seu olhar para a moça que, então, calou-se e recebeu dois tiros a queima roupa. O atirador correu por alguns metros e entrou em um carro preto, sem que eu pudesse ver a placa. Seguiu em direção à zona sul e eu corri até o corpo da moça, mas não havia mais nada a ser feito. Peguei o celular, liguei para policia e aguardei até que eles chegassem. Foi o que aconteceu e assim está escrito no depoimento que eu dei ao delegado.

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Pedro era seu melhor amigo e, em suas conversas, demonstrava estar enfeitiçado por Adriana. Sabia que o namoro de seu amigo com aquela moçra era meio estranho, pois eles se encontravam sempre às escondidas e nunca eram vistos juntos em público. De todos os amigos de Pedro, somente ele sabia do namoro. Pedro era muito passional e, apesar do pouco tempo de namoro, já fazia planos para casar com ela. Entretanto, o jeito daquela menina não o enganava e teve a suspeita de que ela não levava tão a serio assim o namoro com Pedro. Certo dia, flagrou-a, no corredor da faculdade, de conversas com um colega e decidiu investigar a situação. Seguiu os dois em sua moto até um restaurante que ficava a uns dois quilômetros dali, num lugar bastante discreto e retirado da cidade. Os dois pegaram uma mesa na rua e logo pediram uma cerveja ao garçom. Não havia quase ninguém no bar nem nas imediações. Do outro lado da rua, escondido e observando a situação, ele percebeu que o clima começou a esquentar entre os dois e começou a gravar aquilo tudo com seu celular. As imagens estavam ficando ótimas e conseguiu registrar cada detalhe de cada beijo que os dois trocavam. Quando estava decido a parar com as filmagens e correr pra mostrar tudo aquilo a seu amigo, algo inesperado aconteceu. Uma moto, sem placa, veio em alta velocidade, freou e parou em frente ao restaurante. Dela pulou um rapaz encapuzado, que seguiu diretamente na direção de Adriana. De dentro do casaco, o rapaz puxou um revólver e mirou para ela. Encarando-a nos olhos, o motoqueiro a chamou de safada e traidora. Foi quando ela, que pareceu tê-lo reconhecido pelo olhar (era seu amigo Pedro), pediu para que ele não atirasse. Mas ele nem quis ouvi-la e logo mandou dois tiros no seu peito. Subiu na moto e fugiu em disparada. E ele tinha filmado aquilo tudo. Saiu de mansinho, sem que pudesse ser visto, e foi direto para casa. Não deu nem dez minutos e Pedro chegou por lá. Mal entrou na porta e já foi lhe dizendo: “- Mano, acho que to encrencado, pois fiz uma grande bobagem”. E ele se pergunta: o que fazer?

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