Quase

Eleni Nizu

O elevador avança, sem escalas, até o décimo primeiro. Ela sente diminuir, na mesma velocidade, a convicção de que deveria estar ali. Vasculha a cabine, busca uma câmera – quer saber se, além da sua consciência conservadora, alguém mais a observa. Se o porteiro já não a tivesse anunciado, talvez reconsiderasse o convite.

Frustra-se ao encontrar a porta fechada, nada amistosa, nem um sorriso à sua espera. Toca a campainha e aguarda alguns longos segundos. Ele a recebe, enfim, mais gentil que afetuoso. Embora se conheçam há um bom tempo, a iminência do envolvimento compromete a naturalidade de ambos. Sozinha desde a separação e motivada por grande curiosidade, acolheu com simpatia as investidas daquele homem que, afinal, desperta nela um raro e saudável interesse.

No apartamento, evidências da mudança recente. Tons sóbrios, poucos objetos, muitos livros. Discreto e masculino como seu consultório. Talvez um espumante tornasse o cenário mais acolhedor – pensa ela. Tenso, o anfitrião encontra alguma dificuldade em acionar o sofisticado sistema de som. Solidária, ela o socorre. A música e o brut bem que se esforçam para amenizar o constrangimento dos quase amigos que agora põem em risco essa condição, mas o senso de humor, tão inerente aos dois, simplesmente os abandona à própria sorte.

Cautelosos, aproximam-se. Os abraços não se encaixam. Insistem. Acostumada a vê-lo como um ser imaterial, alguém que beira o etéreo, ela agora comprova a volatilidade daquele homem tão fascinante – seu corpo não tem cheiro, seu beijo não tem gosto, suas mãos não têm paixão. Um som providencial interrompe o desconforto: chamam-no do hospital. Ele pede desculpas e, delicado, sugere que voltem a se encontrar. No sorriso mútuo, formal, o acordo tácito: quase estranhos.

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