Um jogador


Mônica Mello

Ainda havia muita gente nas salas. Depositou algumas fichas no vermelho. A
roleta girou.

– Vermelho! - gritou o crupiê.

Mais 100.000 reais. Olhou para um lado, para o outro. Meteu as mãos nos
bolsos e tirou mais fichas. Fixou o olhar no vermelho. Sempre o vermelho. Ali
as pôs.

– Vermelho! - gritou o crupiê.

Curiosos começaram a se aproximar. Alguns cochicharam em seus ouvidos.
Outros gritavam: caia fora! vai perder! Enfiou de novo as mãos nos bolsos. A
camisa estava empapada. Tirou o lenço, passou na testa. Pôs para fora o forro
com as fichas. Depositou no mesmo lugar.

– Vermelho! - gritou o crupiê.

A multidão gritava. Vai perder! Vai perder! Manteve as fichas no vermelho.
O crupiê fixou os olhos nele. Trêmulo, pegou o lenço encharcado de suor. A
roleta girou. Estava parando perto do preto. Parou.

– Vermelho! - gritou o crupiê.

Agarrou as fichas e enfiou-as nos bolsos da camisa, das calças. Correu para
trocá-las. Corajoso! Gritavam. Esbarrava nas pessoas, caíam-lhe as moedas
dos bolsos. Lá fora, apressou-se mais ainda. Olhou para trás. Começou a
correr. A multidão vinha gritando: Corajoso! Um baque. O corpo é jogado para
o alto e desaba no asfalto. A multidão que o perseguia revira-lhe os bolsos. O
carro nem parou para socorrê-lo. Um dos transeuntes ainda tinha gritado

– Vermelho!

O segredo da viela

Cyro Brayner

— Me dá o ferro... Agora desemborca esse troço! – Ordenou.

— Espera, é pesado – retorquiu o menino.

— Assim, infeliz! Tem que ser rápido antes que alguém chegue. Vê o que tem no bolso –
apontou.

— Olha, uma carteira... E... Um maço de cigarros...

— Passa pra cá... Opa, hoje tem!

— Quero um cigarro – disse o menino.

— Toma moleque... Tira logo o pisante desse playboy. Hummm... Acho que cabe no meu pé!

— Quero ficar com o celular – falou o garoto. - É arretado!

— Que nada maloqueiro, vou vender essa bagaça... Vou encher o bolso! Toma dez conto, pra
ser feliz!

— Eu só fico com merreca – queixou-se, cruzando os braços.

— Se oriente seu moleque, o ferro é meu e a ideia foi minha... Eu fiquei de butuca no playboy
e dei o migué,você só fez meter fogo. Já ta até acostumado né, diabo... Corre cão, os home já
tão aí!

— Perdeu, perdeu! Parado, filha duma mãe! – gritou o policial.

— Mataram esse rapaz só pra roubar – lamentou outro policial estalando a língua . -Esses
bandidinhos nojentos!

— Esse de menor aqui já era... Mas o outro ainda ta gemendo ali, acho que também não
escapa... Duas mortes, vai dar bronca!

— Vai nada, vamo dá é o lavra daqui! Ninguém viu, ninguém ouviu e ninguém nunca vai
saber... A gente ta longe da nossa área de policiamento. Vão agradecer a Deus por menos duas almas sebosas no mundo – sorriu.

— E se o outro escapar? – indagou.

— Escapa não... Espera aqui... Ah, verifica se tem dinheiro aí com esse moleque, pode ser que
pague pelo menos o nosso lanche!

— Pelo amor de Deus, seu guarda, me mate não... Eu me rendo, me leve, home, me leve!

— Seu guarda é o escambau! Já era pra você, otário!

E disparou.