Disparada

Pedro Thomaz Masullo




Montado em seu cavalo Arisco, Gerônimo chegou a São Paulo após vinte dias de viagem, desde que deixou seu amado sertão. No percurso pensava em sua mulher, em seus cinco filhos e vez ou outra conversava com Arisco. Entre os monólogos uma coisa o intrigava: o alerta de sua mulher... 
-Zefina disse que em São Paulo tão caçando os sub...sub o que mesmo ela falô? Não me lembro, mas parece que lá tem bandidos perigosos perseguidos pela polícia. –iniciava os anos de chumbo.
Não demorou muito para ser avistado e considerado suspeito por agentes do DOI-CODI.Cercado por três carros, vários agentes saltaram dos veículos e...
- Pare, levante os braços e jogue a arma no chão!
- Isso não é arma. É meu rifle pra me protegê dos animar. 
- Insolente!  Que animal perigoso tem no centro da cidade de São Paulo? Pombos?- gritou um dos agentes, que lhe desferiu duro golpe de cassetete, fazendo-o cair de cima de seu cavalo.
- O que eu fiz? - perguntou incrédulo e atordoado o sertanejo.
- Cale a boca. De longe percebi que se tratava de outro subversivo.
- É isso! Subver..., não sei que é isso, mas me confundiram com o bandido que Zefinafalô.Seomoço eu não sôbandido não.
Mal terminou de falar e outro golpe de cassetete, agora na boca de Gerônimo, que passou a sangrar.
- Capitão, o que faço com o cavalo do comuna? - perguntou Azevedo.
- Mate-o. No centro de São Paulo só os cavalos da Força Pública podem transitar!
Gerônimo tentoucontestar a ordem do capitão, mas tarde demais,Arisco foi covardemente executado.
- Leve esse comunista ao centro de operações, faça-o confessar e lavre o auto deprisão em flagrantepor crime contra a segurança nacional.
- Senhor capitão, a lavratura de flagrante consome muito tempo e não tereia ceia com minha família. 
- Você tem razão, minha família também não merece passar sem mim. Que tal arquivarmos o processo?
- Entendi capitão. Arquivarei profundamente!
O pobre Gerônimo foi levado a um local ermo e escuro onde uma cova já esperava a próxima vítima da ditadura. Um tiro na cabeça, o corpo jogado no buraco e ainda vivo enterrado.Gerônimo expirou pela última veze se viu no lombo de Arisco retornando para a sua Josefina e seus cinco rebentos.
- Arisco,ocê tá vivo? Eu tô vivo tamém? Não acredito!  Não sei o que aconteceu, mas vamovortá agora mesmo pro nosso sertão. De lá não saio nunca mais. 
Arisco vai galopando, o galope deixou de atritar o solo, passou a cavalgar no ar e subir, subir...
- Arisco,ocêtá voando? Assim vamochegá em casa a tempo de assisti a missa de Natar!
Arisco e Gerônimo seguiram seu rumo desaparecendo no interior das nuvens que se assemelhavam a imensos flocos de neve em pleno verão brasileiro da noite de Natal.

Um comentário:

  1. Apesar de alguns errinhos, gostei do conto.
    Também escrevo contos há tempos.

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