Cinderela

Isabel Maria Alves Mezzalira  

- Bom dia!

- Bom dia. Posso ajudar?

- Sim. Eu procuro sapatos, de salto alto e fino, que sejam pretos, mas com um laçarote prata em cima. Está tão difícil de achar...Já estive em três lojas e nada.

- Temos vários modelos, minha senhora. Por favor, sente e aguarde que trarei os modelos. Qual é o seu número?

- 34, mas dependendo da forma pode ser 35.

- OK.

O vendedor voltou com muitas caixas e quase tropeçou no tapete.

- Trouxe vários modelos, minha senhora. Esse é o que mais se aproxima do seu pedido, mas é tamanho 35. Quer começar por ele?

- Sim – Ela pegou o sapato na mão e achou lindo! Preto, brilhante, devia ser de verniz, com um laçarote prata, perfeito, com salto alto, mas a ponteira era arredondada. Nada elegante pensou.
- Não tem bico fino? – perguntou ao vendedor.

- Acho que tenho aqui – disse o vendedor abrindo outra caixa. Sacou um pé com laçarote dourado.
- O laçarote é dourado, minha senhora. Pode ser?

- Não, precisa ser prateado porque o vestido tem detalhes em prata. Precisa combinar, inclusive, com minha bolsa!

Das caixas abertas restava apenas uma rasgada de tanto manuseio. A compradora suspirava, pensando em trocar o vestido, quando o vendedor sacou dessa caixa o sapato perfeito. Bico fino, laçarote prata, salto alto e até um detalhe lateral, também prata. Lindo!

- Bem, esse é nº 33. O último e único. Trago sempre, mas os pés geralmente são maiores. Quer experimentar?

- Sim, quero – disse ansiosa a compradora. Perfeito! Coube como uma luva! Confortável, macio, brilhante. O laçarote tinha um desenho especial.

Nem perguntou o preço. Finalmente havia encontrado. Saiu apressada da loja pensando em como seria maravilhosa a noite calçando aqueles sapatos mágicos.

Serenata

José Luiz Carvalho

Ele entrou na cozinha, deu um beijo na testa da mulher e soltou logo a novidade:
– Resolvi que vou aprender a tocar violão.
– Uau! Parabéns! Violão é um instrumento muito charmoso.  Mas de onde surgiu essa paixão repentina pela arte? – perguntou ela, enquanto organizava a mesa.
– Acho que está no sangue?
– É mesmo? Não me consta que haja músicos na sua família.
Olhando para o celular, ele respondeu orgulhoso:
– Engano seu! Acabo de descobri que o irmão do meu bisavô paterno tocava prato na banda da cidade.
– Parece pouco – disse ela,com suave ironia.
– Então você acha que um prato é um instrumento sem valor apenas por ser simples e supostamente de fácil execução?– perguntou,enquanto buscava na internet lojas especializadas em equipamentos musicais.
– Acho! Mas se você gosta tanto, por que não se dedica, assim como seu parente, a este instrumento e esquece o violão? – perguntou ela, mais preocupada com a novela que começaria em poucos minutos.
– Não,isso não faz sentido. Preciso de um instrumento que ofereça mais flexibilidade, seja popular e menos escandaloso.
Ela se aproximou, passou a mão em seus cabelos já um pouco esbranquiçados e comentou em tom de brincadeira:
–Não quero te desanimar, mas tem certas coisas que só se aprende quando se é jovem. Andar de bicicleta, nadar, dirigir... tocar violão.
– Lá vem você novamente com seus preconceitos. Sua tese hoje em dia já está ultrapassada.
– Ok, retiro o que eu disse. Mas existe algo que não se compra nem se pega emprestado em qualquer idade: talento. Quem tem já começa a demonstrá-lo ainda nas fraldas – afirmou ela na tentativa de minimizar suas expectativas e uma futura frustração.
– Sinceramente, da minha mulher eu esperava um pouco mais de incentivo. Ao invés disso só ouço comentários negativos. Não importa! Vou te mostrar que tenho garra.
– Quero ver!
Neste instante, ele pôs o celular sobre a mesa, simulou que tivesse um violão nos braços, aproximou-se da janela e revelou desapontado:
– Eu estava tão entusiasmado que já imaginava a seleção das músicas da primeira serenata que faria para você. Mas pelo visto terei cantar em outra freguesia.
– É! De fato, oferecer uma serenata tocando um prato seria bastante complicado; confusão na certa – disse ela, em tom de zombaria.
– Por que você não esquece este maldito prato e tenta enxergar o lado romântico da minha intenção? Depois as mulheres reclamam que os maridos não são mais os mesmos.
Ela pediu desculpas e disse que a serenata seria muito bem-vinda. Alertou apenas que para aprender qualquer instrumento é necessária muita dedicação e persistência.
– Ouvi dizer que nos primeiros dias os dedos do violonista doem muito. Além disso, é melhor você se aventurar apenas nos solos ou acompanhamentos, pois sua voz é muito desafinada. Isso não sou eu quem diz – completou.
Neste instante ele raspou a garganta, acalmou as cordas vocais ultrajadas e alfinetou:
– O que você entende de música para me dar essa gongada? Na sua família, por acaso, tem alguém que toque pelo menos prato?
– Eu já havia me esquecido do prato. Você é quem está retomando o tema.
– Está bem. É melhor interromper essa discussão e jantarmos logo. 

– Concordo. Toma aqui seu prato e bom apetite!

SOMBRAS NOTURNAS

Pedro Barbosa

Abri os olhos na primeira noite quando ouvi um barulho seco. Não era como se uma porta tivesse sido batida ou um trovão retumbado, era mais como aquele barulho que o laço dos carroceiros faz quando atinge o cavalo. Quando sentei na cama percebi que meu quarto nunca havia parecido tão assustador quanto naquela madrugada. A luz da rua refletia os galhos de uma árvore fazendo garras enormes se projetarem na parede. Um escuro ameaçador era visível abaixo de minha cama e o silêncio era absoluto, com exceção daquela batida seca. Ela se repetiu duas, três, quatro vezes.        
          
Apesar de na época ter apenas sete anos e estar apavorado apertando meu ursinho de pelúcia, minha curiosidade falou mais alto. Havia algo intrigante acontecendo na minha casa e eu precisava saber o que era.     
Assim que abri a porta do meu quarto o barulho se repetiu. Agora parecia muito mais alto. SPLAC! Com certeza vinha da sala. Caminhei pé por pé, sem fazer nenhum ruído. O corredor, que não tinha mais que 5 metros, nunca pareceu tão grande. Quando finalmente cheguei ao final, estiquei a cabeça lentamente e espiei.        
A cena que vi me paralisou. Senti cada pelo do meu corpo se arrepiar e apertei com força a mão no meu ursinho. Finalmente as histórias de terror que eu adorava ler saíram dos livros e chegaram na minha casa. Havia um monstro na sala.          
Esse monstro não era como a maioria dos que eu tinha visto. Não era vampiro, lobisomem, bruxa ou qualquer outra criatura horrenda como a dos livros. Esse era um monstro que parecia com o papai. Não que ele fosse totalmente idêntico: os seus olhos eram vermelhos como os do papai nunca foram. Além disso, uma enorme poça de suor estava marcando sua camiseta em volta do pescoço e uma veia saltava de sua jugular. Apesar de parecer o papai, aquele mostro nunca poderia se fazer passar por ele. Sua expressão, que era de raiva, ódio e rancor, se contrastava com aquela que eu estava acostumado a ver: calma, tranquila e equilibrada.        
O monstro estava sentado em silêncio com um copo vazio na mão e uma garrafa com um enorme número 51 no rótulo em sua frente. Quando largou o copo e ficou em pé percebi que na outra mão ele segurava um cinto de couro marrom igualzinho àqueles que meu pai usava quando saía para trabalhar.           
Caminhou com frieza até o outro lado da sala, onde percebi que mamãe estava. Ela ficou imóvel, encolhida, acuada... Como o nosso cachorrinho Budy ficava quando papai brigava com ele por ter feito xixi no lugar errado. Seus olhos estavam imóveis e arregalados.  
Ele levantou a mão que ainda segurava o sinto na direção dela e fez um movimento rápido. Meu susto foi tão grande que fechei os olhos. A única coisa que sei sobre aquele gesto é que ele fez o barulho se repetir. E ele se repetiu, repetiu e repetiu. Entre um movimento e outro eu escutava apenas o choro baixinho de mamãe, que entre soluços murmurava algumas palavras. "Monstro... O que eu te fiz?... Por favor..."          
Voltei rápido para meu quarto. Fechei a porta e fui para a cama, torcendo para que ele não me encontrasse. Fiquei quietinho no escuro escutando aquele barulho por mais algum tempo, até que ele finalmente parou. O silêncio se tornou absoluto pelo que me pareceu uma eternidade, e acabei pegando no sono de novo.          
No dia seguinte eu simplesmente não consegui tirar o monstro da cabeça. Cada vez que eu fechava os olhos ele estava lá, com aquela expressão aterrorizante e aquele cinto na mão. Percebi que mamãe também estava com medo do monstro. Quieta, encolhida, com os olhos inchados. Não que fosse a primeira vez que ela estivesse assim, muito pelo contrário, isso acontecia algumas vezes. Será que aquela não tinha sido a primeira visita dele?
 
Pela noite, quando estava indo dormir, contei para mamãe que eu estava com medo por que na noite anterior havia visto um monstro. Ela abriu então um sorriso pela primeira vez naquele dia e me disse que eu não precisava me preocupar, porque monstros não existiam, eram fruto da nossa imaginação. 
           
Mesmo assim passei aquela noite inteira, e todas as próximas também, em estado de alerta. Eu deitava no escuro e ficava esperando o monstro aparecer, e às vezes ele aparecia. Sempre nas noites em que meu pai não estava em casa. Aquele barulho seco intercalado com o choro baixinho da minha mãe e algumas palavras sendo ditas entre soluços. Meu medo era tanto que eu nem tinha mais coragem de sair do quarto para assistir, só ficava lá de tocaia esperando para saber se aquele não era o dia em que o monstro viria atrás de mim.         
            
Um dia então eu decidi que ao invés de esperar ele chegar, eu que deveria ir atrás dele para salvar a mamãe. Eu soube disso enquanto assistia ao Samurai Jack no Cartoon Network. Se o Jack podia derrotar todos os monstros com sua espada, por que eu não poderia derrotar um monstro também? Fui até a cozinha escondido e peguei um enorme facão que papai usava para fazer churrasco e escondi comigo. Eu estava pronto para enfrentá-lo.          
            
Quando deitei para dormir naquela noite sabia que ele viria. Quando o papai não estava em casa ele sempre vinha. Esperei até tudo começar de novo, e começou do mesmo jeito de sempre, com o barulho seco. Eu levantei e fui em silêncio até a sala, como da última vez, mas agora eu segurava um facão ao invés de meu ursinho. 
            
Ao espiar pelo vão do corredor, o que vi parecia uma reprodução do que eu já havia visto: minha mãe em um cantinho, acuada, com os olhos arregalados, e o monstro caminhando na direção dela segurando o cinto. Até aquela garrafa com o 51 estava em cima da mesa com um copo vazio ao seu lado. Tudo exatamente igual.      
           
Quando ele chegou perto dela e fez aquele movimento com o braço, fazendo o barulho mais uma vez, eu fiquei com os olhos abertos, não fiquei escondido como da outra vez. Comecei a correr na direção daquele monstro horrível. Quando cheguei perto simplesmente dei uma facada na perna do desgraçado. 
            
Foi como se o tempo tivesse parado.     
           
Eu vi, como se fosse em câmera lenta, o monstro dar um urro que mais parecia o rugido de um leão. Ele olhou para mim com aqueles olhos esbulhados, levantou a mão vazia e bateu ela com força na minha cabeça. Eu fui lançado contra a parede e caí.      
            
Depois disso, enquanto eu via tudo em minha casa girar de maneira confusa, ainda assisti a ele virar com muito mais fúria na direção da mamãe, gritar algo que eu não compreendi e dar um forte soco na cabeça dela.      
           
Apaguei.      
           
Quando eu acordei novamente percebi que um barulho de sirene estava invadindo meus ouvidos e que uma luz vermelha piscava na sala. A dor na minha nuca estava muito forte e eu escutava um zumbido. Só quando virei a cabeça para olhar novamente para mamãe é que percebi que mais pessoas haviam chegado. Dois homens de branco estavam em volta dela e um terceiro caminhava na minha direção. Fechei os olhos e dormi de novo.      
            
Essa foi a última vez que a vi. Na manhã seguinte ela faleceu no hospital devido a um traumatismo craniano. O monstro fugiu e nunca mais voltou, mas acredito que ele tenha ido atrás do papai, porque ele também nunca mais voltou para a casa depois desse dia.      

Apelo

Ana Carotti

— Oi, é a Sharon?
—Sim, quem é?
— Gabriel. Voltei de viagem. Preciso falar com você.
— Ah, sim… Desculpe. Quer retomar as sessões? Nossa, quanto tempo! Tenho um último horário já ocupado e depois não atendo mais.
— Sharon, é de suma importância te ver, digo, conversar com você. Voltei de muito longe e foi uma viagem muito difícil.
— Foi atrás de outro vilão?
— Digamos que sim.
— Não o pegou, assim como aquele Psicopata Castrador que procura? É por isso que deseja me ver?
— Nesse caso o peguei.
— Parabéns!
— Não há o que comemorar. Posso passar em seu consultório?
— Te ligo. E se o outro paciente deixar de vir, conversamos.
— Pode verificar agora? Fico na linha.
— Bom... Na verdade ele já disse que está a caminho, infelizmente não há horário disponível hoje. Depois desse paciente, tenho que fechar o consultório.   
— Por favor, doutora, nem que seja por alguns minutos, tenho que te encontrar.
— Mas tenho que sair logo em seguida.
— Está a pé?
— Geralmente pego um taxi.
— Para onde?
— Botafogo.
— Te levo. 
— Nossa! Agora estou preocupada. Pode me adiantar o que está lhe incomodando tanto?
— Acredite, será melhor falar pessoalmente. É caso de vida ou morte.  
Sharon silenciou-se
— Sharon? Você sabe que trabalho em uma delegacia, acabo sabendo das coisas. Preciso...
— Sim, precisa falar comigo.
— Estou preocupado. Estou observando uma imagem onde você está saindo do banheiro feminino do posto de gasolina momentos antes daquele filho da puta que procuro há mais de um ano matar duas mulheres. O Psicopata Castrador. Como mencionei em diversas sessões e você leu nos jornais; ele tortura, castra e mata suas vítimas. Preciso lhe dar dicas para não se tornar uma vítima.
— Me diga, como você poderá me proteger desse psicopata?
— Reconheci alguns comportamentos padronizados momentos antes de realizar o crime.
— Quais?
— Ele monta um altar, com santos e flores, perto do local onde planeja atacar. Vejo um altar perto de seu consultório, nesse exato momento.
— Espera, meu paciente está chegando... Olá. Pode entrar... Gabriel, vou ter que desli-


Dia de sorte

 Ana Beatriz Cabral

Meu nome é Dias. Dias D. Sort. Não é um nome, é um vaticínio. Eu sei. Coisas de pais neohippies da década de 60. 2060, entendam bem. Quase cinquenta anos depois, me acho aqui, talvez com alguma sorte. Decidam vocês.

Naquela manhã resolvi ir ao trabalho de carro. Sou um homem às antigas. Com a proliferação de implantes de teletransporte e a diminuição da população, as ruas ficaram mais vazias.  Mas eu ainda não me acostumei com o efeito desse dispositivo. Tenho visões. 

Voltando àquela manhã, estava sentado à mesa, lendo o jornal holográfico do dia, quando ela entrou. Sentou-se em frente ao meu chefe que quase derrubou o café, mas manteve a pose. Ela não percebeu ou fingiu não perceber o efeito que causava no ambiente.

Só tem homens no escritório. Só tem homens no prédio. E no quarteirão também. As mulheres se rebelaram por volta de 2087 e ocuparam Marte, fundando uma colônia inteiramente feminina. Na saída, levaram os estoques dos bancos de esperma e os animais de estimação. No Planeta Terra só tem homens e ratos. Atualmente, mais ratos que homens, já que a reprodução foi descontinuada e todas as tentativas diplomáticas de trazê-las de volta falharam.

Então, a visão daquela deusa era algo semelhante à bomba de Hiroshima naquele escritório poeirento. Não tive dúvidas, levantei e fui andando na direção dela. Precisva comprovar que não era outra holografia. Fiquei perto o suficiente para observar a criatura. Provavelmente sintética,feita no Japão, sob encomenda. Acabamento de primeira, sem falhas na pele. Japão, não, devia ser russa. As bonecas robóticas japonesas sempre tinham olhos enormes. Russa, com certeza. Loira, olhos azuis, meio tristes, tailleur bem cortado. Coisa fina.

Meu chefe me olhou de soslaio e disse – anote.

A história triste era a seguinte: mestre desaparecido há dois dias. Sem contato. Pessoa importante da sociedade. Não podia revelar o nome. Sua bateria estava acabando, se não encontrasse seu mestre em 24 horas, o único com o código de acesso ao carregador, entraria em modo hibernação. Inútil para sempre. Ninguém mais poderia usufruir daquela deusa cibernética. Uma pena!

 – Vá com ela – disse o chefe.

Todo meu corpo tremeu, pelo menos as partes originais dele. 

A limo flutuante ancorou na varanda do escritório. Ela entrou. Eu atrás dela observando aquelas curvas perfeitas. Deu o comando de voz – para casa - e o veículo partiu na velocidade da luz.
Saíamos da atmosfera e entramos em um daqueles condomínios orbitais que só se via em anúncios. A propriedade era monumental. Um castelo cheio de serviçais. Ainda bem que eu era um homem das antigas.

O mordomo nos recebeu com bebidas e trajes prêt-à-porter encapsulados. Já era quase hora do jantar. Adentrei o recinto empertigado no smoking sob medida automático. Ela trajava um longo azul de veludo. Um decote mais profundo que o Grand Canyon.  E ainda lia meus pensamentos obscuros. Certamente, tinha o módulo empatia original de fábrica.

Enquanto meu olhar deslizava no abismo do decote, me dei conta da bela armadilha em que caía. Onde estavam aqueles olhos tristes? Não havia Mestre sumido algum,era um artifício.
Eu tinha poucos minutos para pensar em alguma solução. Já imaginava ela e seu dono desfrutando das partes originais do meu corpo - e no mau sentido do termo. Na hora, me arrependi de não ter aproveitado a oferta do aplicativo de inteligência Smart Plus. Teria que me virar com os meus instintos básicos mesmo.

Ela me guiou para um sofá enorme e me serviu outra bebida. Percebeu meu desconforto e sentou-se bem perto de mim. A boca carnuda, vermelha e entreaberta exibia uma língua nervosa entre dentes perolados e discretamente alongados. A boneca era romena.Dei um gole rápido no Brandy. Perfeito. Derrubei o resto do liquido no vestido azul. Afastou-se com horror. Nenhuma mulher, sintética ou não, permanece bem humorada com um vestido manchado.

Acionei o dispositivo de teletransporte implantado no cotovelo esquerdo. Apareci no trabalho, conforme programado, nu em pelo.

- Já chegou? – Perguntou o chefe, sem demonstrar espanto.

Peguei a roupa sobressalente na gaveta e me vesti.

- E o mestre sumido? Descobriu quem é?

- Conde Drácula – respondi.

Ele riu. Eu não. Ainda sob efeito do deslocamento molecular, achei os dentes do chefe muito pontudos para o meu gosto...